segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Eu sentei e chorei...



Eu sentei e chorei

Conta a lenda que tudo o que cai nas águas deste rio...
se transforma nas pedras do seu leito.
Ah, quem me dera que eu pudesse arrancar o coração
do meu peito e atirá-lo na correnteza,
e então não haveria mais dor, nem saudade, nem lembranças.
Nas margens do Rio Piedra eu sentei e chorei.
O frio do Inverno fez com que eu sentisse as lágrimas na face,
e elas misturaram-se com as águas geladas que corriam diante de mim...
todas estas águas se confundem com o mar.
Que as minhas lágrimas corram assim para bem longe...,
e então eu esquecerei o Rio Piedra, o mosteiro...
os caminhos que percorremos juntos.
Eu esquecerei as estradas, as montanhas
e os campos dos meus sonhos
- sonhos que eram meus, e que eu não conhecia.
Eu lembro-me do meu instante mágico,
daquele momento em que um "sim" e um "não"
podem mudar toda a nossa existência.
Parece ter acontecido há tanto tempo e,
no entanto, faz apenas uma semana que
reencontrei o meu amado e o perdi.
Nas margens do Rio Piedra escrevi esta história.
As mãos ficavam geladas, as pernas entorpecidas
pela posição e eu precisava parar a todo o instante.
- Procure viver. Lembrar é para os mais velhos - dizia ele.
Talvez o amor nos faça envelhecer antes da hora
e nos torne jovens quando a juventude já passou.
Mas como não recordar aqueles momentos?
Por isso escrevia, para transformar a tristeza em saudade,
a solidão em lembranças.
Para que, quando acabasse de contar a mim mesma esta história,
a pudesse lançar no Piedra -
assim me tinha dito a mulher que me acolheu.
Para que então - as águas pudessem apagar o que o fogo escreveu.
Todas as histórias de amor são iguais.

Paulo Coelho
"Nas margens do Rio Piedra"

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